Eu tenho dificuldades de me "caber".
O tempo passou, passa e vai passando, mesmo agora enquanto digito estas palavras.
Preciso de tradução.
Preciso me traduzir.
Preciso que me traduzam.
Em cima do penhasco, me alargo - me vejo queda, me vejo asa.
No rio calmo, me sinto correnteza e me percebo ficando, ao mesmo tempo que vou indo.
Hoje sou casa, mas já fui solo...
Me consolo com o fato de não ser acabado - sou casa no tijolo prestes a ser rebocado.
Tenho sementes em forma de silêncio - guardo-os: tenho medo delas serem comidas pela ignorância de quem não conhece o seu próprio próximo passo.
Por isso me esgotei de tanto falar e deixei que as palavras escorressem como a chuva escorre pela folha verde da árvore.
Me vi envolto ao vento e ele brincava comigo - vezes eu o perseguia e outras vezes me perseguia ele, assim, ambos exaustos dormimos um nos braços do outro.
A ausência me devolve-me a mim, antes esquecido no colo de qualquer alguém - busquei os gestos de amor que perdi no outro que não soube amar.
Eu tomo café comigo mesmo e descobri que o espaço vazio também fala...
O espaço não preenchido, não confere solidão e de tantas vezes ferida, a alma sempre conhece o caminho...
Eu não tenho pressa.
...e no caminho, descubro que fui escrito: então sou folha e tinta vestido de pele e osso e um dia me transformarei em história e ai, viverei.