quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

A Verdade vos fará livre (O Jesus da Mangueira) II



"...se alguém deseja seguir-me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz dia após dia, e caminhe após mim (...) porquanto, de que adianta o ser humano ganhar o mundo inteiro, mas perder-se ou destruir-se a si mesmo?".

(Ev. Lucas 9.23-25)


Nasci de peito aberto, de punho cerrado
Meu pai carpinteiro desempregado.
(Trecho do enredo da escola de samba mangueira)

Surge de pronto uma questão a ser abordada: Há alguma relação entre o Jesus da mangueira e o Jesus dos Evangelhos? No artigo anterior abordei esse assunto de forma leal. Há uma relação de identidade no sofrimento humano, mas e o resto? O enredo aborda apenas esse lado sociológico? Se o lance era dizer que a mangueira também tem o seu próprio Jesus, questiono: O Jesus da mangueira é o mesmo dos Evangelhos? Nos comentários (comentaristas dos desfiles), as pessoas diziam que o Jesus dos Evangelhos e o Jesus do enredo, eram o mesmo, mas ao mesmo tempo não era. Se o Jesus da mangueira é o Jesus dos Evangelhos, faltou muitas informações no enredo ou o enredo privilegiou apenas partes isoladas de uma hermenêutica frágil de algumas passagens evangélicas. Agora se o Jesus da mangueira não é o Jesus dos Evangelhos, então não há mais nada o que dizer e assim, paramos por aqui.

No entanto, suponhamos que o Jesus do enredo seja o Jesus dos Evangelhos. Assim sendo, faltou colocar o propósito de seu nascimento, seu ministério, seu sacrifício, sua morte e sua ressurreição. Tudo bem, tudo bem, você pode estar dizendo: "Cara, isso não é um tratado teológico, é um enredo, apenas um enredo". Tudo bem, compreendo a sua indignação para comigo. Sejamos honesto então: se é apenas um enredo, ele priorizou apenas um lado da história, certo? O lado que lhes melhor convinha. Sendo assim, a informação a respeito de "Jesus e sua obra" está incompleta. 

O Jesus da Gente! Mas de que gente o enredo fala?

Na minha abordagem sobre o "Jesus da mangueira", no artigo anterior, abordei com todo respeito, a ideia a ser transmitida pelo enredo. Fechei meus olhos e procurei sinceramente sentir o que o enredo gostaria de transmitir e expus conforme o que ele transmitia. Não fui leviano e nem desonesto. Agora, sejamos honesto, repito, sejamos honesto: Qual a verdadeira mensagem do Jesus dos Evangelhos? Observem: não estou perguntando qual a verdadeira mensagem do Jesus dos Evangélicos, mas sim, a verdadeira mensagem do Jesus dos Evangelhos. Repito! Sejamos honestos.

Que tal começarmos por arrependimento?

"O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo. Arrependei-vos, e crede no evangelho".
(Mc 1.15).

Que tal se falássemos sobre o texto acima: "...se alguém deseja seguir-me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz dia após dia, e caminhe após mim (...) porquanto, de que adianta o ser humano ganhar o mundo inteiro, mas perder-se ou destruir-se a si mesmo?".

"Negue-se a si mesmo".

Os homens precisam largar seus preconceitos contra tudo aquilo que o enredo da mangueira denuncia, mas e o resto? Os mesmos que denunciam estão dispostos a renunciar as suas vidas e seguir o Jesus dos Evangelhos? Dá para renunciar a ganancia? A sede de poder? É possível negar a bebedice e o alcoolismo que destroem o corpo que Deus lhes deu? É possível renunciar e segui-lo? Fala-se de preconceito contra as minorias e os que moram nas favelas,tudo bem, mas seria possível renunciar o ódio que as pessoas possuem da moral cristã? Porque todo esse ódio? É possível renunciar? Há denuncias no enredo, de cunho social, mas Jesus se identificou com o sofrimento das minorias. Agora, as minorias identificam-se com o sofrimento de Jesus na Cruz? Porventura vocês sabem porque ele sofreu? Alguns bradam da seguinte forma: "Ele sofreu por amor". De fato, mas ele se entregou por outro motivo: você sabe? Pois bem, ele entregou-se por causa da rebelião do homem contra o seu Pai. Alguém já lhe disse isso? Jesus se entregou por que os homens estão em rebelião contra Deus. O Jesus na cruz, revela o coração amoroso de Deus e também o grau de depravação humana. 

Sejamos honestos! O apóstolo Paulo dirá: "Pois o que primeiramente lhes transmiti foi o que recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras..." (I Co 15.3,4). O terrível é que estão tentando encobrir essa informação.

O menino do buraco quente ou o menino pelintra...
O que mora na favela, o gay, o negro discriminado, a mulher, em fim, todos! Ele assumiu a cruz por todos! Agora pergunto-lhes: Todos estão dispostos a assumirem a sua cruz e seguir após ele? Ele assumiu a cruz de todos, mas alguém está disposto a assumir a sua própria cruz e segui-lo?

Vejamos os dois lados da história! Sejamos honestos...

Os homens estão dispostos a renunciar aquilo que lhes destroem?
Estão dispostos a renunciar essa ideia de uma sociedade sem Deus?

Sejamos honestos...
Quem pratica o crime está disposto a renunciar?
Quem é cúmplice do crime, está disposto a renunciar?
Quem é adepto da pornografia infantil está disposto a renunciar?

Sejamos honestos...
Falta alguma coisa no enredo da escola de samba da mangueira.

"...e os homens continuam escondendo a verdade por causa de suas injustiças" (Rm 1.25)




A Verdade vos fará livre (O Jesus da Mangueira)





"Todo aquele que o Pai me der, esse virá a mim; e o que vem a mim de maneira alguma o excluirei"

(Ev. João 6.37)



Eu tô que tô dependurado

Em cordéis e corcovados
Mas será que todo povo entendeu o meu recado?
Porque de novo cravejaram o meu corpo
Os profetas da intolerância
Sem saber que a esperança
Brilha mais na escuridão

(Trecho da letra do enredo da Escola de samba mangueira)

Até ontem (terça-feira) não havia assistido o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro (geralmente não assisto), mas devido a vários comentários em torno do desfile e da letra do enredo, me assentei para assistir.

Muitas cores, musica, dança e um grito sociológico de cunho também religioso, ecoava na avenida. Na comissão de frente da bateria, uma mulher, vestida de um azul belo, carregando em sua cabeça uma coroa de espinhos artesanal, carregando no peito a plenos pulmões o trecho do enredo que dizia: "O Jesus da gente". A rainha da bateria Evelyn Bastos representou Jesus como mulher e a comissão de frente mostrou um Jesus pobre e com apóstolos negros. O samba cita um Jesus de “rosto negro, sangue índio, corpo de mulher”, e menciona “profetas da intolerância” que não sabem que a “esperança brilha mais que a escuridão”. Ainda dentro do pano de fundo sociológico, a escola também organizou a ala “Bandido Bom é Bandido Morto”, mostrando a violência diária cometida como política de governo contra jovens pobres e negros no Brasil. Também para deixar claro a intolerância do Brasil de Bolsonaro, a ala das baianas remetia a religiões de matrizes africanas, enquanto um grupo lembrando a personagem bíblica Maria Madalena levava uma placa com o arco-íris LGBT,  dizendo “Vai tacar pedra?

De fato um espetáculo bem montado e com objetivos bem definidos. O grito da escola de samba deixa claro: "Nós também temos o nosso Jesus!". Um Jesus negro, descriminado que também sofre racismo, mas também um Jesus da favela, de gente pobre desprovida de assistência e muitas das vezes, entregue a criminalidade ou a mercê dela. Eis ai, o Jesus da comunidade LGBT, descriminados por optar por uma orientação sexual diferente da conservadora ou do conservadorismo. A mensagem clara é: "Nós também temos o nosso Jesus". O Jesus da mangueira, é o Jesus que se identifica com todas as classes sociais, principalmente com os menos favorecidos. O Jesus da mangueira, pode ser visto no rosto do negro, da mulher vitima de violência, do garoto arrastado pelo crime e morre com o corpo crivado de balas. O Jesus da mangueira está impresso no rosto do menino do "buraco quente", do "garoto pelintra". O Jesus da mangueira não está em tronos, mas nas ruas, nas favelas, nos guetos, nas vielas, nos bares e etc. 

Ora, é claro que o Jesus dos evangelhos está aberto a todos. Ele mesmo disse: "Vinde a mim todos vós que estais cansados e sobrecarregados e eu vos aliviarei..." (Ev. Mateus 11.28 - 30). É absolutamente aceitável que ele receba todos esses citados pelo enredo da mangueira: pobres, negros, índios, gays, os que moram em favelas, a mulher que sofre violência dos homens embrutecidos, em fim, Jesus de fato e de verdade está ai, identificando-se com o sofrimento humano. O Jesus que anda na periferia é de fato o Jesus que no evangelho, andava entre os pobre e aqueles escorraçados pela religião petrificada e os clero corrompido. Quando dizem: "Os profetas da intolerância Sem saber que a esperança Brilha mais na escuridão", estão cobertos de razão! Há muita intolerância e pouco diálogo.

Particularmente, depois de ter assistido e procurado entender a postura e a mensagem do enredo da escola, acredito que há uma demanda social e humanitária no Brasil que deva ser assistida. Urge uma aproximação equilibrada entre Igreja e sociedade em suas mais diversas manifestações e orientações. Há um grito vindo do sambódromo! Um grito recheado de revolta e de criticas a sociedade conservadora do Brasil e disto, não resta a menor duvida. Vivemos em uma sociedade pluralista e assim, não podemos nos esquivar de tal realidade.

Mas, há um outro lado da história que não foi contada no sambódromo e nem na letra do enredo da escola de samba mangueira e é sobre isso que falarei no artigo seguinte.

Bora lá?


quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

ETHOS




Palavras...
Ah! Essas palavras soltas...
Loucas.
Constroem mundos e destroem pessoas.

Vivemos atualmente em um mundo onde as pessoas falam muito e ouvem pouco.
Não há, pelo menos a priori, nenhuma preocupação com aquilo que irá sair de seus lábios: simplesmente verbalizam ou, em muitos casos, há verborragias

As noticias surgem a cada instante: em cada, uma novidade estrondante. Os telejornais estão hiper politizados ou tendenciosos à determinadas ideologias politicas. Assim, sabedoria para quê? A defesa das tendencias partidárias estão em primeira lugar. Há uma onda desenfreada de palavras...

Palavras mal-ditas.
Palavras bem-ditas.
Palavras que interditam.

Palavras.

Que tal se nós falássemos um pouco sobre ética?!
Ética?! Ética é tudo aquilo que acertamos entre nós que nos fornecerá os axiomas para vivermos bem. O que todos deveria fazer para viver bem? Qual o caminho? Como transitar no meio das polaridades? Como evitar os extremos? Que existência queremos? Uma vez em que aqui, estamos todos morrendo. Como viver ou morrer melhor? Como saber se portar diante das polemicas existentes? De que lado? Direita ou esquerda? Quem tem razão? Quem está com a verdade?

De fato, estamos andando pelo chão árduo dos questionamentos. As pessoas falam pela boca e  muitas das vezes, fecham o cérebro. Não seria melhor fechar a boca e abrir o cérebro? Porque tanto ódio? Porque tanta sede de poder?! Para quê tanta ofensa? 

Ética.

Precisamos urgentemente de repensar e renovar o pensamento ético da atualidade. Os valores, os verdadeiros valores estão sendo atacados de todas as formas. Quando tento falar sobre valores e valores verdadeiros, não me baseio em ideologias politicas ou quaisquer outras (se fossemos resgatar a história da ética, veríamos o quão animalesco vivemos) falo tão somente da vida que se vive agora, já! Neste momento. Que ética vivemos? Todos gritam por liberdade, mas o que é liberdade? Todos pedem o direito de ter direitos, mas que direitos? O direito que lhes é devido, não lhe autoriza a romper o direito do outro. Que direitos queremos? E se queremos direitos, por que não exigimos direito o que de direito temos? Que ética vivemos? De falar o que quer, mesmo não sabendo do que se fala? Somos autônomos na fala ou reproduzimos o que ouvimos de outros? Somos uma voz ou massa de manobra? Pessoas ou mamulengos? O que somos? 

Os telejornais ditam o que pensamos? Os partidos Políticos ditam o que pensamos? O que pensamos? Como pensamos? Da onde pensamos? Qual é a fonte do nosso pensamento? Poderíamos dizer que pensamento e pensar,como ato psicológico, não devem ser confundidos. Além disso, o pensar não é puramente intelectual, mas o sensório-motriz também "pensa". 

Gritamos: 
- Queremos a verdade!!!
No entanto, não sabemos a verdade que queremos.
Que verdade queremos?!

A verdade dita contraria ao que diz o nosso opositor? Ou a verdade que seja verdade, mesmo que essa verdade seja a verdade que é verdade, do nosso opositor? Que verdade queremos?

Ética.
Precisamos de ética.

Uma ética que seja conduzida por uma moral não patológica, dúbia, bifurcada, mas uma ética cuja linha não fornece curvas: não para uns, mas para todos. Uma ética que anda junta com a liberdade que nada mais é do que está preso a valores que beneficiem o outro.

Se o que me faz livre, me livra para maltratar o outro, então não há liberdade, mas prisão e prisão fétida

Ética.

Mas que ética queremos?!

Precisamos de uma ética que gere vida.
Onde ou aonde ela está?!


quarta-feira, 12 de fevereiro de 2020

Normose




"Eles enchem seus corações de insensibilidade, e suas bocas transbordam de arrogância".
(Salmo 17.10)

O vento sopra e bate no rosto.
Mas que rosto?
A chuva cai e molha a pele.
Mas que pele?
Há um ser que anda, mas não sente.
Vê, mas é que se não visse.
Tornou-se indiferente.
Gritam: Morte!!!!
...e lá na frente há uma multidão apressada.
Cada um segue seu caminho ou descaminho.
Cada um pisa a estrada em que os pés são levados a percorrer.

Um corpo caído no chão! Grita uma senhora.
É esterco que a água da chuva levou.

Quando o ser humano perde a sensibilidade, ele simplesmente fica embotado, estupidificado e por fim, torna-se cruel. 
Anaisthesia ou a insensibilidade, anestesia, entorpecimento, brutalidade e grosseria. Há quem já tenha se acostumado com isso e trata tudo com normalidade. As manchetes nos jornais, as denuncias nas redes sociais e o tânatos nas ruas. Nada mais atinge parte da sociedade. Chamamos isso de NORMOSE: a PATOLOGIA DA NORMALIDADE.

Há morte de mendigos nas ruas.
Assaltos nas esquinas.
Queima de moradores de rua.
Envenenar gatos.
Corrupção nas entidades governamentais.
Roubar e dividir com outros.
Dar um jeitinho.

Tudo normal.

Tudo, patologicamente normal.
Tudo insensivelmente normal.
Tudo imbecilmente normal.
Brutalmente normal.
Cinicamente normal.

Matar tornou-se pratica rotineira.

No entanto, dentre esses que perderam a sensibilidade, ainda há um povo sensível que denuncia a pedagogia insolente da violência. Há os que olham e percebem que a maldade está naqueles que sabem fazer o bem e ficam estagnados.

Urge denunciar esse esquema de entorpecimento!
Urge gritar a plenos pulmões: Basta!!! Acordem!

A Humanidade está em extinção.