quarta-feira, 28 de julho de 2021

A Importância da Psicologia no ambiente Cristão - A Questão do Clero

 


Como o Clero é um conjunto de homens que ocupam posição superior numa religião e no caso, da igreja cristã evangélica, quem ocupa essa posição são em geral os pastores e presbíteros, iremos nos manter ligada a importância da psicologia na vida pastoral.

A vida pastoral é revestida de muita responsabilidade e seriedade. Talvez por causa disso o ministério pastoral seja um ministério que lida com tensões e cobranças quase que o tempo todo. A responsabilidade de sempre ter uma palavra, um sermão, um aconselhamento correto, uma oração para fazer em forma de intercessão, um abraço forte, uma palavra de incentivo (...). Através dessa pequena lista já é possível imaginar o quanto é tenso o ministério pastoral. Por isso a psicologia ao ser colocada a serviço tanto do ministério pastoral para auxiliar o próprio pastor quanto para auxiliar o desenvolvimento do seu próprio ministério, constitui-se numa ferramenta de ajuda indispensável. Citarei algumas tensões as quais o pastor é submetido.

1.       O Endeusamento do Pastor. Essa se constitui em uma tensão absurda! Mas ela é real. O fato é que muitos dentre da igreja, por algum tipo de carência acaba transferindo para o pastor certas necessidades que apenas Deus pode supri-las. Até esse momento da relação entre membro e pastor é possível manter certo controle da situação. No entanto o problema é quando o pastor tentar de alguma forma encarnar esse deus que as pessoas tanto buscam nele. Neste ponto a tragédia bate a porta. Aqui o pastor terá que fazer uma opção: ou ele assume essa posição de deus e alimenta o desejo-transferência da igreja e fica de bem com todos ou ele não assume isso e compra briga com algumas pessoas que ainda não cresceram na fé. A psicologia entra aqui, justamente neste intervalo. Ela fará com que o pastor analise o comportamento das pessoas e o que estão levando-as a fazerem tal transferência. Mas também o próprio pastor terá a oportunidade de fazer a sua própria análise ou se preferir ser analisado com o intuito de saber a que lado ele está mais propenso.

2.       O Mau Uso do Poder. Esse é outro ponto de tensão para o pastor. A posição pastoral é uma posição, digamos poderosa, mas poderosa no sentido de lhe conferir autoridade. Aqui a tensão é grande visto que confundir autoridade com autoritarismo é bem frequente. O poder pode ser de qualquer pessoa, mas não é qualquer pessoa que sabe lidar com o poder. Muitos pastores se perdem facilmente neste imenso campo de batalha. É preciso se olhar quando se tem poder. É preciso saber o que se passa por dentro de si quando se tem poder. É preciso, é preciso. O mau uso do poder pode desencadear situações constrangedoras e destrutivas porque o mau uso do poder pode transformar uma simples pessoa em um tirano. A história esta diante de nós e pode nos fornecer vários exemplos: Hitler, Mussolini, Saddam Hussein, Ossama Bin Laden e outros que estão em algum lugar deste planeta fazendo suas maquinações satânicas. Esses são os mais conhecidos da humanidade, mas no meio eclesiástico também existem alguns que possuem pouca habilidade com o poder e acabam criando guerras interiores em seus ministérios e congregações. A psicologia está a serviço de tais pessoas para que elas façam uma autoanálise de seus atos, pensamentos e ideais colocando tudo sob o crivo da Escritura Sagrada que é a Palavra de Deus. Com o poder não se brinca, se trabalha em prol de uma vida sadia para o povo.

É importante salientar que não existem regras mágicas ou soluções mágicas para resolver certas tensões. O que acredito que possa existir na verdade, são precauções que o candidato a pastor ou Pastor já em exercício pode tomar. Por exemplo.

 

1.       Antes de assumir uma posição pastoral observe quais são as suas motivações.

2.       Antes de assumir uma posição pastoral verifique a sua linha de pensamento e o seu campo de atuação dentro do ministério pastoral.

3.       Antes de assumir uma posição pastoral observe como lidar com posições que envolve Poder.

4.       Se for assumir uma posição pastoral, saiba que vais passar por pressões e tensões. Vai assim mesmo?

5.       Observe se a sua vocação é mesmo pastoral.

 

Acredito que essas precauções poderão ajudar bastante à vida do futuro pastor ou do já pastor que está pastoreando.

Como podemos ver, não faltam razões para defender a importância da psicologia para o meio cristão. A questão não é estar a favor da psicologia e contra a fé e nem vice e versa. Defender a importância da psicologia para a igreja é uma questão de saúde emocional e bem estar espiritual. É possível conciliar as duas coisas sem anulá-las.


A Psicologia e sua Importância Para o ambiente Cristão

 

Como já sabemos empírica e cientificamente falando, o ser humano é uma complexidade de sentimentos, de ações, pensamentos e reações. Há uma busca constante de autoafirmação daquilo que se é. Mas o que se é? Como se é? É preciso fazer uma leitura do ser humano e suas complexidades, mas fazê-la de uma forma sistemática e pesquisadora.

Em um período de tantas perdas, guerras e luta pela sobrevivência é claro que o interior humano vai se desgastando e isso sugere que ele seja acompanhado e ouvido para que suas feridas, traumas e dores possam ser ao longo do tempo, sanadas. Para isso é que a psicologia como instrumento terapêutico serve: para auxiliar o ser humano tanto nas buscas de si mesmo, quanto nas interrogações e problemas emocionais.

No entanto a psicologia é um campo vastíssimo e vamos aqui falar um pouco o que é psicologia, de sua importância para a igreja cristã e para o meio eclesiástico e Clerical.

Todo assunto a ser abordado como objeto de estudo ou de pesquisa, deve antes de qualquer outra coisa, ser definido.

 A psicologia, nosso objeto de reflexão é uma área de atuação e de pesquisa que estuda o comportamento humano. Enquanto ciência, a psicologia se interessa em compreender o ser humano em sua totalidade, em sua relação com o mundo, a sociedade como como a si mesmo. Por isso os profissionais que trabalham nessa área tentam explicar as várias formas de agir do ser humano: seus pensamentos, comportamentos e emoções são observados visando entender e compreender certas atitudes. Como o ser humano é essa complexidade de sentimentos e pensamentos, a psicologia atua na área de detectar possíveis problemas emocionais ou mentais que estejam prejudicando o andamento da vida normal de uma pessoa.

É importante enfatizar que qualquer pessoa esta sujeito a passar por dificuldades emocionais e enfrentar algum tipo de distúrbio. Digo isso porque em minha concepção “todos” são “todos”. Inclusive pessoas que são adeptos de religiões e no caso aqui especifico as pessoas que congregam em igrejas cristãs. As igrejas tem tido um crescimento considerável no Brasil e todo crescimento populacional, traz também seus problemas. É neste aspecto que a psicologia vai mostrar a sua importância.

Há diversos artigos que apregoam em alto e bom som que psicologia e igreja são antagônicas e por consequências inconciliáveis. No entanto diante de tal declaração podemos medir o grau de ignorância que algumas pessoas possuem por não tratar o assunto de um modo geral, mas simplesmente especifico.

Quando observamos algumas ferramentas utilizadas pela psicologia para o tratamento de algumas doenças emocionais, percebemos que elas podem ser aplicadas a igreja sem dano algum, claro, colocando tais ferramentas a disposição de uma boa reflexão bíblica. Assim sendo creio que a psicologia é importante para a igreja nos seguintes aspectos.

1.       No Sentimento de Culpa. Várias pessoas chegam à igreja e estão na igreja envolvidas com sentimento de culpa e isso acontece porque nesta estrada da vida se comete muitos erros, anda-se por várias estradas cuja terra é cheia de pedras pontiagudas. Feridas, essas pessoas se dirigem a igreja que a principio, é o instrumento de Deus para socorrê-las ajuda-las e restaurá-las. Aqui as pessoas podem se utilizar da psicologia para tentar entender que tipo de culpa essa pessoa carrega. Nessa abordagem a preocupação básica de quem recebe na igreja, uma pessoa com sentimento de culpa deve ter em mente em sua abordagem o que a pessoa fez e o que a levou a fazer. Se ela tem um sentimento de culpa é porque provavelmente fez alguma coisa que, ou sua consciência, ou a sociedade, ou a família, ou alguém dita como errado. Assim sendo é importante diferenciar os tipos de sentimento de culpa.

 

·         Culpa real.

·         Culpa neurótica.

·         Culpa existencial.

O primeiro a aparecer na lista é o sentimento de culpa real e este sentimento existe porque a própria consciência em conjunto com a comunidade testificam que realmente houve um erro ou como é de comum em comunidades cristãs, houve pecado. A Culpa real vem, não de um sentimento duvidoso de culpa, mas de um sentimento real de culpa. Vem de uma culpa real. Ou seja, aconteceu de fato.

O segundo a aparecer na lista é o sentimento de culpa neurótica e esse sentimento não vem por um sentimento objetivo de culpa como acontece na culpa real, mas ele aparece como sentimento subjetivo de culpa. O sujeito sofre com a culpa porque acredita plenamente que é culpado quando toda comunidade ao seu redor diz o contrário. A culpa neurótica vem caminhando pela estrada do mundo imaginário, ou seja, essa culpa só existe na imaginação do sujeito.

O terceiro a aparecer na lista é a culpa existencial e tudo indica que, a culpa existencial é produzida normalmente em cada ser humano. Este ser humano possui uma culpa existencial encravada no seu ser que o deixa sentindo-se quebrado, meio metade e assim se sentindo, sai em busca de se encontrar inteiro. Neste momento entra a igreja e apresenta Jesus que, através do Espírito Santo vai trabalhar esse ser humano até que ele chegue à estatura de varão perfeito.

Em uma análise detalhada de cada sentimento exposto acima, logo entenderemos que esse tipo de sentimento é comum em nossa sociedade e também nas igrejas cristãs. O que a igreja precisa realmente é saber como lidar com cada um deles para que as pessoas que procuram refúgio e auxilio possam encontra-los.

2.       O sentimento de inferioridade. Esse é outro tipo de sentimento comum tanto na sociedade secular quanto nas comunidades cristãs e os motivos que levam a desencadear tais sentimentos também são vários. Às vezes tal sentimento desenvolve-se durante a adolescência, às vezes vem do tempo de criança e ainda às vezes ocorre na fase adulta, depende muito do momento em que a pessoa esteja passando ou enfrentando. O trabalho do psicólogo tendo como instrumento as ferramentas adequadas da psicologia e o conhecimento da Escritura Sagrada é diagnosticar o que está causando tal sentimento de “ser” inferior. É assim que uma pessoa se sente quando nela se desenvolve esse sentimento: “ser” inferior. O que muitas vezes lamento é que no mundo eclesiástico as pessoas relegam um sentimento de inferioridade a apenas uma ação diabólica. Por exemplo: quando alguém aparece na igreja com sentimento de inferioridade, tratam logo em dizer: “Isso é coisa do Diabo!”. E creio que em uma determinada esfera de ação o Diabo se aproveite do momento, mas não creio que toda ação é patrocinada por ele. Há pessoas que se sentem inferiores a outros por não ter conseguido realizar um sonho ou coisas semelhantes. No entanto ela nutriu esse sonho a cada dia. Existe uma poesia de Fernando Pessoa que fala um pouco sobre isso: “Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. A parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo”. (Poemas de Álvaro Campos: obra poética/Fernando Pessoa; organização, introdução e notas Jane Tutikian – Porto alegre, RS: L&M, 2008 p. 160). O texto fala por si, não carece de interpretação. O fato é que todos nós somos sujeitos a transitar nesta via de variações psicológicas. Por isso a igreja dispõe da psicologia como instrumento para auxiliar o processo de cura das doenças emocionais.

3.    O sentimento de baixa estima alta. Aqui está a soma dos dois sentimentos citados acima. A baixa autoestima tem levado muitas pessoas ao ostracismo e depressão. Esse é o tipo do sentimento que agrega em si todo sentimento de in-potencialidade. É a sensação de não ter forças, de não ter pique, de faltar às pernas na hora da corrida. A alta-baixa-estima tem influência direta na vida cotidiana do individuo e pode alterar todas as expectativas a respeito de qualquer coisa. Pode não parecer, mas a igreja está cheia de gente assim. São membros, obreiros e até pastores que se encontram nessa situação, mas claro, não deixam transparecer porque, afinal de contas, o que vão dizer de um cristão com alta-estima-baixa? É justamente desse ostracismo, dessa hibernação, desse casulo que vão nascer às doenças emocionais. O agravamento dessas doenças não vem da doença em si, mas da negação da doença, ou seja, quanto mais eu nego que estou doente mais doente eu fico porque nego. Daí nasce aquela velha dor existencial que tem haver com o modo de como você se vê e vê o mundo ao seu redor. A projeção do olhar vai criando o universo aonde você transita. Certa vez Jesus disse: “Se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo será luminoso; mas, se forem maus todo o teu corpo estará em trevas” (Lc. 11.34). É no olhar a si e as coisas que os sentimentos brotam. Cristo nos deu essa dica para pratica diária. Façamos assim então.


sexta-feira, 2 de julho de 2021

A Antropologia Cultural e o Ambiente Cristão

 


Há na igreja cristã certo receio quanto ao envolvimento cultural na obra evangelizadora, mas é, justamente na obra evangelizadora, que particularmente vejo a influência da antropologia cultural. É praticamente impossível fazer missões sem envolvimento cultural. No entanto a certa resistência da igreja quanto a utilizar certos movimentos culturais para a tarefa árdua da evangelização. É preciso entender que a igreja não pode simplesmente chegar a uma localidade, Estado, País, Aldeia ou vilarejo, com um pacote de elementos culturais e implantá-los nessas localidades pensando que irá obter sucesso. Também é preciso entender que o discurso institucionalizado já não surte mais efeito por que o discurso institucionalizado fala da representação da instituição como organização, mas não fala da fé vivida, experimentada e sentida que supera qualquer experiência institucional. Diante disso, creio que a antropologia cultural ou os elementos de pesquisas e estudos da antropologia cultural servem de elementos úteis como objeto de estudo para a própria igreja.

 

Acredito que a antropologia cultural pode influenciar na igreja e a igreja nos seguintes pontos:

1.       Na evangelização, obtendo como instrumentos elementos da própria cultura.

                2.    Na comunhão com o outro o tendo como sujeito e não como objeto.

3.       Na compreensão da dor que o outro sente.

 

Na abordagem comentada de cada ponto entenderemos melhor o que cada ponto desses indica e sugere.

EVANGELIZAÇÃO OBTENDO ELEMENTOS DA CULTURA COMO INSTRUMENTOS. 

Faz-se necessário abrir esse dialogo entre evangelização e cultura como forma de anunciar as boas novas eficazmente. Sendo essa a missão prioritária da igreja, todos os elementos possíveis e cabíveis que se possam instrumentalizar da cultura são bem vindos. Uma igreja que não dialoga com a cultura como forma de evangelização, perde um elemento importante na estratégia evangelizadora.

Nos dias atuais podemos ver algumas igrejas evangélicas fazendo esse dialogo através da musica e dos estilos musicais que são revestidos com letras e forma de pensar que são totalmente cristãos, com o passar dos tempos isso vai imergindo sutil e subjetivamente na vida da sociedade, tomando proporções gigantescas. É claro que não é tarefa fácil. Injetar isso na mente das pessoas é extremamente difícil. É preciso paciência, dialogo e abertura de espaço, para que tais ideias se encaixe na agenda do pensamento dos evangélicos.  No entanto as luzes de alerta máximo também devem estar ligadas nessa estratégia visto que o dialogo com a utilização da cultura como elemento de evangelização também pode ser ariscado. Há uma linha fina nesse tipo de estratégia: corremos o risco de misturar elementos culturais como estratégia evangelística com envolvimento direto e pratica excessiva do secularismo. Aqui a igreja precisará de liderança sóbria, sábia e firme. O que acontece é que, por muitos anos a igreja foi ensinada a não se utilizar de tais elementos sob um pretexto preconceituoso, individualista e tradicional. As pessoas, a principio, podem ficar entusiasmadas com a ideia e com isso não fazerem distinção entre aquilo como instrumento e aquilo como absolvição de pratica diária. Aqui a antropologia cultural serve de influência no sentido teórico por que passa a treinar e formar pessoas que trabalham nessa área de evangelização.

Evangelizar tendo como instrumento elementos da cultura, significa não se posicionar ao lado, mas exercer a nossa própria cidadania feita com o outro e juntos recebendo o que do Espírito de Deus é nos oferecido. Se conseguirmos fazer isso, a evangelização tornar-se-á um comungar, um partilhar da vida em um envolvimento cotidiano.

 NA CONVIVENCIA COM O OUTRO TENDO-O COMO SUJEITO E NÂO COMO OBJETO.

A antropologia cultural aqui também tem uma participação educadora e dialogal visto que lidar com o outro não é tarefa fácil. Como o ser humano é uma estrada ambivalente e ambíguo é posicional que haja uma percepção maior de suas atitudes e necessidades. É preciso conhecê-lo um pouco melhor antes de iniciar esse dialogo esse contato inicial.

Durante muitos anos a compreensão sobre a dignidade humana foi melhorando e a relação melhorou junto com a compreensão e isso ocorreu por que a consciência sofreu transformações ou amadureceu de forma considerável, fazendo com que a possibilidade do ser humano viver em paz, fosse real. No entanto, parece que hoje essa perspectiva está um pouco abalada. Esse abalo é patrocinado pelos assassinatos, pela impunidade que se alastra a cada dia mais e pelo olhar relativizante do outro, como objeto. A violência que é na verdade uma faceta do mal, vive rondando a comunidade dos homens. Por isso, é preciso um olhar mais para dentro do que para fora: um olhar antropológico. Quando olhamos para dentro de nós mesmo e depois projetamos o olhar na direção do outro, diminuímos a distância entre seres humanos. Precisamos sair de nós para irmos até o outro, transformando a nossa individualidade, em sociedade humana. É disso que a sociedade é feita, antropologicamente falando: é o singular misturado ao plural. Logo no começo, quando comecei a escrever esse trabalho, eu disse e vou repetir: Somos ambíguos. Somos procura e somos procurados.

Dentro dessa perspectiva e desse olhar antropológico, a cultura é essencial para unir as pessoas. É claro que as diferenças culturais existem, mas para se chegar a um ponto comum, é necessário que as diferenças sejam colocadas de lado a fim de se chegar a esse ponto comum. Um ser humano não é igual a outro ser humano, mas também não precisa ser tão diferente. Se eu conseguir olhar o outro como olho a mim, estarei dando um grande passo para que esse outro que eu olho, não seja visto por mim como objeto. Se eu projeto um olhar à outro o vendo como objeto, automaticamente me vejo como objeto. Logo, o inverso também é verdadeiro. Por isso digo que a antropologia cultural é importante neste aspecto. Ela possibilitará esse “olhar” o outro de outra forma. Uso a palavra “olhar” por acreditar que dentre tantas coisas que podem criar o universo social e cultural ao nosso redor, o olhar é o ponto de partida para essa criação. Como se olha ou como se vê, se cria.

NA COMPREENSÃO DA DOR QUE O OUTRO SENTE

Não é tão difícil ver no mundo em que vivemos a presença sempre incomoda da dor. Ela está, cotidianamente na agenda dos homens. Quem captou de uma forma poética e profunda tal dor, foi Francisco Otaviano que foi advogado, jornalista, Politico e poeta. Ele disse o seguinte:

Quem passou pela vida em branca nuvem, E em plácido repouso adormeceu Quem não sentiu o frio da desgraça, Quem passou pela vida e não sofreu; Foi espectro de homem, não foi homem, Só passou pela vida, não viveu”.

É extremamente complicado definir o que seja a “dor’, mas Francisco Otaviano descreve bem neste poema o seu significado de uma forma sutil. Ao verificarmos analiticamente, a história do mundo tem sido construída em cima de muitas lágrimas e soluços. Não há uma tribo, povo, raça, nação ou grupo que não tenha vivido ou não esteja vivendo momentos intensos de dor pois ela faz parte da linguagem universal e é manifestada através da lágrima, às vezes não precisa nem de intepretação. Quando na percepção do outro procuramos as diferenças, acabamos encontrando certas igualdades e a dor que eu sinto pode até não ser a mesma dor localizada do outro, mas é dor do mesmo jeito. Na dor “sentida” todo mundo é igual.

Diante disso é importante lembrar que aqui a igreja possui um papel fundamental, visto que se propaga nos púlpitos que ela possui o Consolador. Quando a igreja estuda antropologicamente a sociedade que está ao seu redor e percebe que nela há elementos culturais que lhes favorecem como estratégia de evangelização, ela pode, digo a igreja pode detectar as dores dessa sociedade e oferecer como minimizador ou alivio dessa situação, o bálsamo que todo grito incubado necessita: o Consola-dor.

É preciso oferecer, mostrar, indicar, apontar o Consolador à aquelas pessoas que vivem culturalmente, envolvida em dor. São as mães que sofrem a perda dos filhos para o tráfico de drogas, as esposas que perdem seus maridos para o alcoolismo, os jovens envolvidos no crack , na cocaína. A igreja precisa mostrar as pessoas que sofrem dores interiorizadas e as que sofrem dores exteriorizadas que, em matéria de dor, todos nós somos iguais e que quem nos oferece alívio e conforto diante de todas essas situações é Jesus, na Pessoa do Consolador. Se a igreja conseguir realizar essa missão, teremos a certeza de estarmos caminhando em um caminho de cura e de alivio para a existência do outro.

Chegando a um pensamento, parcialmente conclusivo quanto a esse trabalho, o que fica de reflexivo aqui é o seguinte:

A Linguagem antropológica do ser, é relação. Isto significa que não nasci apenas para mim mesmo, mas nasci para o outro também. Sou um ser gregário, preciso estar em grupo, preciso do outro, preciso de relação de me relacionar, de estar em contato.

É preciso haver abertura na igreja para essa antropologia do encontro. Qualquer estudo ou pesquisa que não visa ou não promove esse encontro do ser humano com o ser humano, será vista como pura ciência, descompromissada com o homem em sua totalidade, relegando-o à apenas um objeto de estudo. A igreja que pode e deve utilizar as pesquisas antropológicas deve ir ao encontro do homem e promover a salvação integral desse mesmo homem. Não há mais espaço para o isolacionismo, partidarismo ou qualquer outro “ismo” que atrapalhe o trabalho missionário e evangelístico da igreja. 

 




Antropologia Cultural


Tudo indica pelo decorrer da história, que o homem parece ter sido, ou melhor, parece que ainda é o centro das discussões e preocupações filosóficas e antropológicas. Cheio de ambiguidades e paradoxos, o ser humano é conhecível e desconhecível, na mesma proporção em que está perto também está distante, às vezes protege, mas também agride, grita, mas também cala, anda pela rua, mas recolhe-se intimamente, agrega e dispersa, corre e anda, na mesma proporção que concorda, discorda. O ser humano é lógico e ilógico.

A leitura que fazemos do ser humano é uma leitura pluriforme: conceituamos, porém, nosso conceito sobre o ser humano às vezes é des-humano e pré-conceituoso. Há uma inquietação na busca do sentido para o ser humano e um debate enorme, quanto a sua origem. No entanto a antropologia tem se dividido em vários setores de reflexão, para oferecer respostas à questão que atravessa os séculos: o que é o homem? Dentre esses vários setores em que esta dividida a antropologia, esta a que nós conhecemos como antropologia Cultural.

 Antropologia é a ciência que tem como objeto de estudo o homem e a humanidade, abrangendo todas as suas dimensões lançando sobre ele um olhar questionador e investigador. Aqui o homem é visto como um Ser a ser pesquisado e interrogado. Certa vez Juvenal Arduini, professor de filosofia da Faculdade de Filosofia São Tomás de Aquino, fez o seguinte questionamento com uma rápida declaração:

“Afinal, quem é o ser humano? É ser inconcluso. É pulsação original. É interpelação inquietante. É ser movediço. É existência peregrina. É identidade dançante. É reboliço antropossêmico. Mina de significados”. (Antropologia: ousar para reinventar a humanidade/ Juvenal Arduini – São Paulo – Paulus 2002 p.21).

Inusitado! Enigmático, mas extremamente inquietante a questão levantada e declarada do professor.

Cultura é o conjunto de atividades e modos de agir, costumes e instruções de um povo. É processo em permanente evolução, diverso e rico. Emerson Giumgelli, doutor em antropologia social, afirma o seguinte sobre a cultura:

“... a cultura é definida como um sistema de símbolos, os quais articulam e veiculam uma rede de significados. Se a cultura compõem-se de símbolos que permitem interpretar a realidade, são também interpretações da cultura que cabe ao antropólogo fazer”. (Sociologia da religião: enfoque teóricos, Faustino Teixeira (org). 2 ed. – Petrópolis, RJ; Vozes, 2007. P.200). 

A partir do conceito de antropologia e Cultura, podemos dizer que Antropologia cultural estuda a diversidade cultural humana procurando compreender o homem como um ser cultural e social visando seu comportamento em grupos e relações sociais. Diante disso a observação a ser feita de inicio é que o campo preenchido pela a antropologia é bastante vasto e dominá-lo é tarefa árdua e complexa restando-nos apenas passear pelo campo que a nossa mente e compreensão possa atingir e sinceramente falando, possivelmente iremos andar por caminhos singulares, pois assim nascem os campos antropológicos provocando divisões e sua pluralidade de direções.

A antropologia cultural pode ser dividida em etnologia, linguística e arqueologia. No século XX grande partes dos estudos estavam voltados a registrar os diferentes estilos de vida de diversas culturas que ainda não tinha experimentado a influencia da modernização. Os estudos estavam focalizados na organização social, na religião, nas formas diferentes de vestir, na cultural material, na linguagem. Durante a metade do século XX a etnologia conhecida hoje como, antropologia cultural associou o seu campo de estudo a antropologia social desenvolvida por britânicos e franceses. Depois de anos de pesquisa, os antropólogos da cultura desenvolveram a estratégia que acabaram chamando de “observação participante”. A proposta é a seguinte: o antropólogo se introduz na vida da comunidade e por meio de contatos e observações cotidianas, desenvolve a sua pesquisa. É de se imaginar que isso não era um trabalho fácil de realizar visto as grandes dificuldades que cada pesquisador enfrentava para concluir, em partes o seu trabalho, visto que dependo da localidade onde ele realizava as pesquisas a língua falada era um desafio a mais e aprender a linguagem das comunidades onde eram inseridos levava semanas e até meses. Mas essa era a melhor forma para adquirir conhecimento das comunidades e movimentos sociais. Estar presente participando da vida diária e dos costumes das pessoas, geram um grau de conhecimento.

A partir do momento em que existe esse contato em comunidade há também um compartilhamento de informações e trocas de interesses mútuos, pois toda comunidade vive em torno de certos propósitos específicos e isso é o interessante. São indivíduos que desenvolvem relações entre si, pois a cultura lhes forneceu normas que dizem respeito aos modos apropriados de comportamentos diante de certas situações. É importante enfatizar que quem transita neste universo cultural precisar despir-se de seus conceitos e pré-conceito acerca da vida individual: não há espaço para o individualismo numa vivência em comunidade. Culturalmente falando, nós sabemos que no Brasil, por exemplo, especificamente em alguns estados brasileiros, digamos assim, a convivência é bastante impregnada de pré-conceitos e é impregnada de pré-conceitos por que desde pequenos, os filhos da comunidade aprendem a ser preconceituosos e isso também é cultura. Às vezes escutamos alguém dizer: “Fulano não tem cultura”. Pronuncia equivocada, pois todo mundo tem “cultura”. Todos nós estamos inseridos em algum tipo de cultura por que todos nós aprendemos costumes, normas, estilos, forma de vestir, falar, se expressar e conduzir a vida. De um jeito ou de outro, todos que fazem parte de uma comunidade, de um estado, de um país esta automaticamente inserido e misturado em sua cultura. Às vezes usamos a seguinte expressão: “Ah! Isso é cultural, faz parte da cidade”. O que queremos dizer com tal frase é que, virou um costume, que se impregnou na sociedade, aquele tipo de prática. Isso varia de pessoa para pessoa, de Estado para Estado e de país para país.

No nosso Brasil, por exemplo, onde há uma diversidade enorme de culturas por que cada estado tem seus próprios costumes, seu modo de agir e pensar, são um campo fértil para pesquisa antropológica. Há estados brasileiros que possuem gosto variados de musica, dança comida, vestes e comportamento próprio de ser. O nordeste brasileiro, por exemplo, é chegado num forró como opção de dança, num baião de dois como opção de comida, numa praia como opção de terapia livre e entretenimento, numa roupa mais leve como opção de vestes por causa das altas temperaturas. O dialogo cultural entre os nordestinos é fácil e rapidamente identificável. Aonde um nordestino chega é rapidamente identificado. Ora, o sotaque é forte, a expressão é pesada e a forma de ver a vida é diferente.

Quero destacar algumas manifestações que fazem parte da cultura Nordestina, por exemplo:

1.       A Cultura do riso. Os nordestinos gostam de dar boas gargalhadas e para isso procuram fazer piada de todo tipo, inclusive de situações bem delicadas como, por exemplo, a questão da fome e da baixa renda de seus trabalhadores. Creio que isso é feito também como uma forma de driblar a tristeza e a angustia de algumas pessoas. O sorriso os faz esquecer um pouco a dor provocada pelos problemas. Aqui também entra um pouco a questão da dor Cultural. O riso também serve para isso. Por dor Cultural quero dizer da falta de estrutura educacional que passam os nordestinos e quando não há essa estrutura educacional o peito se enche de dor e com essa dor vem o grito de desespero que desemboca na marginalização. Por isso o nordestino, visando sufocar um pouco essa dor, faz piada de tudo: do gás quando falta, do bolso liso (falta de dinheiro) quando não se tem dinheiro, de se estar só o bucadim quando se está doente, de se estar com a barriga roncando quando se está com fome e de dizer que vai dar certo quando tudo já está errado. Diante de uma situação assim, o nordestino busca força e esperança no sorriso da piada desengonçada. Não é fácil lidar com a dor cultural, mas o nordestino vai driblando as dificuldades com muito humor, sorrisos e coragem. Afinal de contas nordestino é cabra macho.

2.       A Cultura do Artesanato. O artesanato é outra marca da cultura do nordeste. Os trabalhos feitos em madeira, barro, areia e outros elementos tendo como inspiração a própria imagem humana, os animais e a natureza são facilmente encontrados. O nordestino é criativo e o que pensa em fazer em forma de arte, acaba fazendo. No Nordeste encontram-se as famosas areias que nas garrafas transformam-se em paisagens maravilhosas, além das redes com punhos fortes e macia para dormir.

3.       A Cultura do forró. A musica é outro elemento interessante na vida do nordestino. O forró é musica e dança típica do nordeste. É muito difícil ouvir outra musica nos rádios e nos programas de TVS que não seja forró ou tenha similaridade com o forró. A turma é chegada em um forrózim. É na dança e na musica que o nordestino tira o cansaço da semana de trabalho. No final de semana o destino são as casas de forró aonde bandas organizadas tocam musicas até o sol despontar no céu. Antes, as musicas sempre de duplo sentido dividiam a opinião das pessoas, mas agora o romantismo invadia a musica forrozeira no nordeste. Dificilmente alguém ao vir para o nordeste, não dance um forró. Cidades como: Ceará, campina grande na Paraíba, Maceió e Recife são adeptas do forró além de outros estilos de musicas também.

4.        A Cultura do jeitinho brasileiro. Na verdade a cultura do jeitinho não é exclusiva do nordestino, na verdade, na verdade, essa cultura é uma cultura do Brasil que o nordeste apenas pegou emprestado e encarnou com muita propriedade e humor. Tudo indica que o jeitinho nasceu no meio do “Não pode e o será que a gente pode resolver de outra forma?”. Por exemplo: a fila está quase dobrando o quarteirão e de repente chega uma pessoa e quer entrar na fila, mas deseja ficar mais perto de ser atendido e a estratégia adotada é ir de mansinho furar a fila, ou seja, entrar na frente de alguém, mas rapidamente ele é detido e impedido, alguém chega e diz: “Ei moço! A fila começa lá atrás, viu?”. Então sutilmente ele responde: “Será que a gente não pode dar um jeitinho? Por que eu estou no horário de serviço e não posso demorar”. Pronto! Essa é a jogada do jeitinho brasileiro. O antropólogo brasileiro Roberto DaMatta fala a respeito do jeitinho brasileiro dizendo o seguinte:

 

“O “jeito” é um modo e um estilo de realizar. Mais que modo é esse? É lógico que ele indica algo importante. É sobre tudo um modo simpático, desesperado ou humano de relacionar o impessoal com o pessoal...”. (DaMatta Roberto, O que faz do brasil, Brasil, ed. Rocco, 2001 p. 99).

 

É nesse circulo que o “não pode” vira o “pode”, mas recheado de jeitinhos brasileiro. Esse jeitinho vai gerando no útero da sociedade, novos estilos e formas para driblar certas situações. Do jeitinho vai nascendo a malandragem, no bom sentido, claro. A malandragem da fala mansa, da tranquilidade, do não-estress e assim se vai caminhando. 

Nesse ponto o jeitinho vai virando parte da cultura do brasileiro e do nordestino. Antropologicamente falando, o homem vai se adaptando de acordo como as situações vão surgindo ou de acordo como as situações vão surgindo o homem vai dando o seu jeitinho.