Há
na igreja cristã certo receio quanto ao envolvimento cultural na obra
evangelizadora, mas é, justamente na obra evangelizadora, que particularmente
vejo a influência da antropologia cultural. É praticamente impossível fazer
missões sem envolvimento cultural. No entanto a certa resistência da igreja
quanto a utilizar certos movimentos culturais para a tarefa árdua da
evangelização. É preciso entender que a igreja não pode simplesmente chegar a
uma localidade, Estado, País, Aldeia ou vilarejo, com um pacote de elementos
culturais e implantá-los nessas localidades pensando que irá obter sucesso.
Também é preciso entender que o discurso institucionalizado já não surte mais
efeito por que o discurso institucionalizado fala da representação da
instituição como organização, mas não fala da fé vivida, experimentada e
sentida que supera qualquer experiência institucional. Diante disso, creio que
a antropologia cultural ou os elementos de pesquisas e estudos da antropologia
cultural servem de elementos úteis como objeto de estudo para a própria igreja.
Acredito
que a antropologia cultural pode influenciar na igreja e a igreja nos seguintes
pontos:
1.
Na evangelização, obtendo como
instrumentos elementos da própria cultura.
2. Na
comunhão com o outro o tendo como sujeito e não como objeto.
3.
Na compreensão da dor que o outro
sente.
Na abordagem comentada de cada
ponto entenderemos melhor o que cada ponto desses indica e sugere.
EVANGELIZAÇÃO OBTENDO ELEMENTOS DA CULTURA COMO INSTRUMENTOS.
Faz-se necessário abrir esse
dialogo entre evangelização e cultura como forma de anunciar as boas novas
eficazmente. Sendo essa a missão prioritária da igreja, todos os elementos
possíveis e cabíveis que se possam instrumentalizar da cultura são bem vindos. Uma
igreja que não dialoga com a cultura como forma de evangelização, perde um
elemento importante na estratégia evangelizadora.
Nos dias atuais podemos ver algumas
igrejas evangélicas fazendo esse dialogo através da musica e dos estilos
musicais que são revestidos com letras e forma de pensar que são totalmente cristãos,
com o passar dos tempos isso vai imergindo sutil e subjetivamente na vida da
sociedade, tomando proporções gigantescas. É claro que não é tarefa fácil.
Injetar isso na mente das pessoas é extremamente difícil. É preciso paciência, dialogo
e abertura de espaço, para que tais ideias se encaixe na agenda do pensamento
dos evangélicos. No entanto as luzes de
alerta máximo também devem estar ligadas nessa estratégia visto que o dialogo
com a utilização da cultura como elemento de evangelização também pode ser
ariscado. Há uma linha fina nesse tipo de estratégia: corremos o risco de
misturar elementos culturais como estratégia evangelística com envolvimento
direto e pratica excessiva do secularismo. Aqui a igreja precisará de liderança
sóbria, sábia e firme. O que acontece é que, por muitos anos a igreja foi
ensinada a não se utilizar de tais elementos sob um pretexto preconceituoso,
individualista e tradicional. As pessoas, a principio, podem ficar entusiasmadas
com a ideia e com isso não fazerem distinção entre aquilo como instrumento e
aquilo como absolvição de pratica diária. Aqui a antropologia cultural serve de
influência no sentido teórico por que passa a treinar e formar pessoas que
trabalham nessa área de evangelização.
Evangelizar tendo como instrumento
elementos da cultura, significa não se posicionar ao lado, mas exercer a nossa
própria cidadania feita com o outro e juntos recebendo o que do Espírito de
Deus é nos oferecido. Se conseguirmos fazer isso, a evangelização tornar-se-á
um comungar, um partilhar da vida em um envolvimento cotidiano.
NA CONVIVENCIA COM O OUTRO TENDO-O COMO SUJEITO E NÂO COMO OBJETO.
A antropologia cultural aqui também
tem uma participação educadora e dialogal visto que lidar com o outro não é
tarefa fácil. Como o ser humano é uma estrada ambivalente e ambíguo é
posicional que haja uma percepção maior de suas atitudes e necessidades. É
preciso conhecê-lo um pouco melhor antes de iniciar esse dialogo esse contato
inicial.
Durante muitos anos a compreensão sobre a dignidade humana foi melhorando e a relação melhorou junto com a compreensão
e isso ocorreu por que a consciência sofreu transformações ou amadureceu de
forma considerável, fazendo com que a possibilidade do ser humano viver em paz, fosse real. No entanto, parece que hoje essa perspectiva está um pouco abalada.
Esse abalo é patrocinado pelos assassinatos, pela impunidade que se alastra a
cada dia mais e pelo olhar relativizante do outro, como objeto. A violência que
é na verdade uma faceta do mal, vive rondando a comunidade dos homens. Por isso, é preciso um olhar mais para dentro do que para fora: um olhar antropológico. Quando
olhamos para dentro de nós mesmo e depois projetamos o olhar na direção do
outro, diminuímos a distância entre seres humanos. Precisamos sair de nós para
irmos até o outro, transformando a nossa individualidade, em sociedade humana. É
disso que a sociedade é feita, antropologicamente falando: é o singular
misturado ao plural. Logo no começo, quando comecei a escrever esse trabalho,
eu disse e vou repetir: Somos ambíguos. Somos procura e somos procurados.
Dentro dessa perspectiva e desse olhar antropológico, a cultura é essencial para unir as pessoas. É claro que as diferenças culturais existem, mas para se chegar a um ponto comum, é necessário que as diferenças sejam colocadas de lado a fim de se chegar a esse ponto comum. Um ser humano não é igual a outro ser humano, mas também não precisa ser tão diferente. Se eu conseguir olhar o outro como olho a mim, estarei dando um grande passo para que esse outro que eu olho, não seja visto por mim como objeto. Se eu projeto um olhar à outro o vendo como objeto, automaticamente me vejo como objeto. Logo, o inverso também é verdadeiro. Por isso digo que a antropologia cultural é importante neste aspecto. Ela possibilitará esse “olhar” o outro de outra forma. Uso a palavra “olhar” por acreditar que dentre tantas coisas que podem criar o universo social e cultural ao nosso redor, o olhar é o ponto de partida para essa criação. Como se olha ou como se vê, se cria.
NA COMPREENSÃO DA DOR QUE O OUTRO SENTE
Não é tão difícil ver no mundo em
que vivemos a presença sempre incomoda da dor. Ela está, cotidianamente na
agenda dos homens. Quem captou de uma forma poética e profunda tal dor, foi
Francisco Otaviano que foi advogado, jornalista, Politico e poeta. Ele disse
o seguinte:
“Quem passou pela vida em branca nuvem, E em plácido repouso adormeceu Quem não sentiu o frio da desgraça, Quem passou pela vida e não sofreu; Foi espectro de homem, não foi homem, Só passou pela vida, não viveu”.
É extremamente complicado definir o
que seja a “dor’, mas Francisco Otaviano descreve bem neste poema o seu
significado de uma forma sutil. Ao verificarmos analiticamente, a história do
mundo tem sido construída em cima de muitas lágrimas e soluços. Não há uma
tribo, povo, raça, nação ou grupo que não tenha vivido ou não esteja vivendo
momentos intensos de dor pois ela faz parte da linguagem universal e é manifestada
através da lágrima, às vezes não precisa nem de intepretação. Quando na
percepção do outro procuramos as diferenças, acabamos encontrando certas
igualdades e a dor que eu sinto pode até não ser a mesma dor localizada do
outro, mas é dor do mesmo jeito. Na dor “sentida” todo mundo é igual.
Diante disso é importante lembrar
que aqui a igreja possui um papel fundamental, visto que se propaga nos púlpitos
que ela possui o Consolador. Quando a igreja estuda antropologicamente a
sociedade que está ao seu redor e percebe que nela há elementos culturais que
lhes favorecem como estratégia de evangelização, ela pode, digo a igreja pode
detectar as dores dessa sociedade e oferecer como minimizador ou alivio dessa
situação, o bálsamo que todo grito incubado necessita: o Consola-dor.
É preciso oferecer, mostrar,
indicar, apontar o Consolador à aquelas pessoas que vivem culturalmente, envolvida em dor. São as mães que sofrem a perda dos filhos para o tráfico de
drogas, as esposas que perdem seus maridos para o alcoolismo, os jovens
envolvidos no crack , na cocaína. A igreja precisa mostrar as pessoas que
sofrem dores interiorizadas e as que sofrem dores exteriorizadas que, em matéria
de dor, todos nós somos iguais e que quem nos oferece alívio e conforto diante
de todas essas situações é Jesus, na Pessoa do Consolador. Se a igreja conseguir
realizar essa missão, teremos a certeza de estarmos caminhando em um caminho de
cura e de alivio para a existência do outro.
Chegando a um pensamento, parcialmente conclusivo
quanto a esse trabalho, o que fica de reflexivo aqui é o seguinte:
A
Linguagem antropológica do ser, é relação. Isto significa que não nasci apenas para mim mesmo,
mas nasci para o outro também. Sou um ser gregário, preciso estar em grupo,
preciso do outro, preciso de relação de me relacionar, de estar em contato.
É
preciso haver abertura na igreja para essa antropologia do encontro. Qualquer estudo ou pesquisa que
não visa ou não promove esse encontro do ser humano com o ser humano, será vista
como pura ciência, descompromissada com o homem em sua totalidade, relegando-o à
apenas um objeto de estudo. A igreja que pode e deve utilizar as pesquisas
antropológicas deve ir ao encontro do homem e promover a salvação integral
desse mesmo homem. Não há mais espaço para o isolacionismo, partidarismo ou
qualquer outro “ismo” que atrapalhe o
trabalho missionário e evangelístico da igreja.
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